quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Material perfurocortante – acidentes 1

O aspecto, relacionado à saúde e segurança do trabalhador, que mais chama atenção dentro de um estabelecimento de assistência à saúde, por certo são os materiais perfurocortantes. Eles quase que se confundem com a execução das atividades. Têm uma característica tão especial que a NR 32 prevê a adoção de dispositivos de segurança para eles. A RDC Anvisa 306/04, que trata dos resíduos de serviços de saúde, os classifica como um grupo específico – Grupo E. Estabelece um coletor especial para eles, com cores e dizeres praticamente exclusivos. E estes materiais podem estar classificados em riscos mais complexos, associando-se, além do risco biológico, com o risco químico (administração de antineoplásicos) e riscos radioativos (administração de contrastes radioativos).

Por que tanta preocupação? Quem, se não os trabalhadores dos serviços de saúde, para saber mais sobre os riscos que estes materiais representam para a atividade laboral?

Quando, em 2007, o Cerest Registro deu continuidade ao programa Risco Biológico, escolheu uma das suas faces – acidentes com perfurocortantes. E, nas oficinas de sensibilização e estabelecimento de vínculo, perguntamos aos trabalhadores que participavam do projeto: você sofreu acidente com exposição a material biológico nos últimos doze meses? Trinta e cinco, dos cento e noventa e nove, responderam que sim. Não parece ser um número muito alto. Mas no mesmo período haviam sido notificados sete acidentes com exposição a material biológico. Apenas vinte por cento dos acidentes haviam sido notificados. Em praticamente todos os acidentes os perfurocortantes estavam envolvidos.

Os trabalhadores em saúde são bastante qualificados. No contato direto com o paciente ninguém é admitido se não tiver, no mínimo o curso de Auxiliar de Enfermagem, e a equipe de enfermagem é a que mais sofre acidentes com estes materiais. Logo a questão, no nosso entendimento, não é de percepção de risco, mas de outra natureza.

Os acidentes com agulhas com lúmen são os mais preocupantes, e os que mais ocorrem. Porque podem, se estiverem com sangue residual, transmitir importantes patógenos, entre eles o vírus da Hepatite B, o vírus da Hepatite C e o vírus da Imunodeficiência Humana. Por certo que os trabalhadores conhecem estes riscos, faz parte da formação acadêmica deles. Então, se estão expostos a importantes agentes patogênicos, se após o acidente envolvendo material biológico é necessário algumas medidas profilática, que são deflagradas após a notificação, por que só 20% dos trabalhadores, que afirmaram terem sofrido acidentes com perfurocortantes, notificaram acidentes com exposição material biológico? Todo acidente com exposição a material biológico, com ou sem afastamento, deve gerar uma Comunicação de Acidente de Trabalho – CAT. Pela Portaria Federal 777/2004, também é de notificação compulsória.

Se não há notificação do agravo, não há como realizar o teste rápido no paciente fonte (ou estão fazendo escondido, sem o consentimento dele? Isto é muito grave.), ou no trabalhador, conforme o caso. Onde está a responsabilidade dos coordenadores de equipe e responsáveis técnicos que permitem esta situação? Então, temos um contingente de trabalhadores expostos a uma situação de risco, que não sabem se realmente estão correndo riscos ou se já adquiram doenças de gravidade conhecida. E por quê?

Na mesma oportunidade, em 2007, perguntamos aos trabalhadores: nos últimos doze meses, você recebeu algum treinamento sobre perfurocortantes? 81% dos trabalhadores afirmaram que não receberam treinamento algum sobre o assunto naquele ano que se passara.

Não basta destilar regras e normas acerca do manejo de perfurocortantes, nem discutir os riscos e perigos envolvidos, penso que o foco deve deixar de ser o artigo para ser o ser humano. Não há medidas massivas capazes de mudar culturas subitamente, o que nos cabe executar é um processo de transformação da realidade, necessariamente ouvindo, tanto no planejamento quanto na execução, os trabalhadores. Valorizar o saber destes seres humanos.

Continuaremos nossa reflexão.

Até breve.
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 .Autor:

Paulo Henrique Garcia de Alencar
Médico Veterinário Sanitarista
CRMV SP 6169
Cerest/Registro
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